terça-feira, 23 de setembro de 2008

Difícil gestão do perdão

Numa pequena cidade francesa, costumava permanecer esmolando à entrada do templo um grupo de pedintes.
À hora das atividades religiosas todos entravam, menos o Leôncio.
Contudo, o oficiante gostava muito dele.
Era humilde, submisso e resignado.
Certo dia, ele não apareceu para esmolar e sua falta foi sentida. Outros dias se passaram e, preocupado com a sua ausência, o guia religioso decidiu procurá-lo. Depois de muito indagar, o encontrou num quarto úmido e sombrio.
Ao entrar para ajudá-lo, muita coisa chamou a sua atenção.
Na parede suja e escura estava um relógio de ouro antigo e valiosíssimo; protegido por uma velha cortina estavam alguns retratos, cujas molduras revelavam extremado bom gosto e um divã revestido de um tecido damascado raro revelava grande valor.
Leôncio percebeu o olhar surpreso e indagador do religioso e então contou-lhe a sua história.
Muito pobre, fora levado para servir no castelo de um fidalgo.
Ainda que revoltado, ele procurou servi-lo bem, chegando a ser seu secretário.
Com isso tornou-se conhecedor profundo das suas transações comerciais e industriais.
Motivos políticos e sociais levaram a região à revolta, com muita gente envolvida.
Aquele fidalgo decidiu fugir com a família para outra região da França, por ter culpa em cartório.
Ninguém sabia o rumo que tomara.
Fora então procurado pelas autoridades que lhe ofereceram alta soma para que revelasse o esconderijo.
Fascinado pelo ouro, Leôncio fez a revelação e o fidalgo e sua família foram capturados e condenados. Contudo, teriam escapado à morte se ele não houvesse feito revelações comprometedoras.
Depois da sentença de morte, o tempo foi passando e teria caducado se não houvesse pedido pessoalmente a revisão da sentença.
- Assim. sinto-me hoje o mais indigno pecador.
Por isso tenho me torturado, mantendo em meu poder esses objetos que representam o preço da minha traição
- Falou ainda Leôncio.
- Bem, mas para Deus não há pecado que não mereça perdão. Busque-o enquanto é tempo, replicou o religioso.
- Não posso crer no perdão para quem premeditadamente fez passar pela guilhotina um casal com duas lindas filhas.
só o caçula foi poupado.
Veja aí sobre a mesinha a foto daquela família.
- Estes são os meus pais.
Você os levou à morte
- Falou o religioso.
- Sim. Eu sou culpado.
E agora?
Ainda acha que Deus me perdoará?
E você?
Resignado e compassivo, o religioso respondeu:
- Se pode crer no perdão de Deus, creia que jamais lhe negarei o meu.

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